Para Ayres Britto, o constitucionalismo, ou democracia fraternal, seria o ponto de afunilamento entre o constitucionalismo liberal e o social. “Ele é o signo mais vivo do humanismo, da vida humana civilizada. É a única forma de introduzir a democracia, não apenas no seio do estado e do governo, mas em toda a sociedade”, disse.
Em sua exposição, Ayres Britto falou sobre a relevância da fraternidade em todo o texto da Constituição Federal, em especial nos objetivos fundamentais expressos no artigo 3°. “A nossa Constituição erige esses valores filosóficos a categorias jurídicas, a bens jurídicos de superior envergadura.” O tratamento fraterno, então, seria um comportamento jurídico imposto, já que a Constituição “governa permanentemente quem governa transitoriamente”.
Presentes à mesa da conferência, os ministros do STJ Rogerio Schietti Cruz e Reynaldo Soares da Fonseca e o ministro aposentado do STF José Néri da Silveira foram citados por Ayres Britto. Segundo ele, os três “conciliam muito bem leveza e firmeza, sobretudo para aplicar o direito”. Para o conferencista, “tratar os outros com atenção, com cordialidade, até com afeto, não é favor, é um dever”.
Essência humana
O ministro Rogerio Schietti falou sobre a importância dos congressos, uma vez que não é frequente a promoção, no meio jurídico, de discussões sobre o direito e a fraternidade. “Mais do que nunca sentimos essa necessidade de vivenciar na nossa atuação cotidiana os valores, as referências que a nossa Constituição da República nos apresenta e nos impõe diariamente”, disse.
Para ele, quando se faz referência à tríade do iluminismo – liberdade, igualdade e fraternidade –, é este último valor que mais tem a ver com a essência do ser humano. “Como dito na declaração de direitos humanos, cabe a nós, como indivíduos, nos nossos papéis sociais, nas nossas relações profissionais e familiares, vivermos em espírito de fraternidade. Não devemos apenas declarar esses direitos, mas efetivamente vivenciá-los.”
Princípio basilar
No primeiro painel do evento, a discussão sobre o tema “A Fraternidade como Categoria Jurídica” reuniu os professores Paulo Muniz, reitor do Centro Universitário Tabosa de Almeida, de Pernambuco; Olga Boschi Oliveira e Josiane Veronese, das Universidades Federais de Pelotas (RS) e de Santa Catarina. Eles debateram a consolidação da fraternidade no ensino jurídico e a fraternidade nos direitos sociais, da criança e do adolescente.
Paulo Muniz considera que “apresentar a fraternidade como um princípio basilar condutor da existência, inclusive do mundo jurídico, é um desafio para aqueles que estão nas universidades, especificamente no ramo do direito”. De acordo com o reitor, é necessário fazer com que esse princípio seja inserido nos currículos e nas atividades acadêmicas, a fim de contribuir para melhor formação dos estudantes, além de fomentar pesquisas sobre o tema.
Fraternidade e direitos sociais
Olga Boschi Oliveira traçou um histórico constitucional dos direitos sociais e falou da sua importância para a estabilidade da sociedade civil. “As políticas sociais não devem ser vistas como atos de caridade pública, mas instrumentos necessários à promoção da autonomia individual, do senso de comunidade e da plena cidadania”, disse, acrescentando que enxerga a fraternidade como “alternativa relacional e jurídica” para o exercício desses direitos fundamentais.
Ao discorrer sobre direitos da criança e do adolescente, Josiane Veronese destacou tópicos como proteção integral, inimputabilidade penal, prevenção e cuidados, entre outros. “Quando uma criança pratica um ato infracional, significa que erramos todos; a humanidade fracassou, em sua dinâmica de formação, acompanhamento e valores”, alertou.
Constituição e filosofia
Os professores Luís Barzotto, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, e Clara Machado, da Universidade Tiradentes, de Aracaju, falaram sobre fraternidade na filosofia do direito e no direito constitucional, respectivamente. Clara lembrou que a fraternidade é uma categoria jurídica constitucional materializada em uma estrutura normativa de princípio com funções. “Não há democracia sem fraternidade”, afirmou.
Luís Barzotto, ao tratar das origens da moralidade, construiu um paralelo entre os seres humanos e outros animais: “Todos nós temos direitos, inclusive os animais, mas o que nos diferencia deles é o fato de que nós também temos deveres. A fraternidade nos humanizou, a fraternidade é um dever moral, ou melhor, é o núcleo da moral”.
Com informações da assessoria de imprensa do STJ.