Na sessão desta quinta-feira (28), o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) começou a julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5794, ajuizada contra dispositivos da Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017) que tratam do fim contribuição sindical obrigatória. Por determinação do relator, ministro Edson Fachin, as demais que discutem o tema estão sendo julgadas em conjunto. Após a leitura do relatório do ministro Fachin, os representantes das partes e das entidades admitidas como amici curiae (amigos da Corte) realizaram as sustentações orais.
Inconstitucionalidade
Representando a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transporte Aquaviário e Aéreo, na Pesca e nos Portos (CONTTMAF), autora da ADI 5794, o advogado Edson Martins Areias salientou que é incontroversa, no seu entendimento, a natureza tributária da contribuição sindical, e que esse fato obrigaria que eventuais alterações se dessem por meio de lei complementar, o que não ocorreu no caso, uma vez que a Lei 13.467/2017 é norma ordinária. Para o advogado, um dos argumentos da facultatividade da contribuição seria beneficiar os trabalhadores, contudo, segundo ele, os trabalhadores terão prejuízo. Sem obrigatoriedade, o trabalhador que ganha um salário mínimo vai deixar de desembolsar 80 centavos por dia, mas deixará de contar com a assistência jurídica gratuita, entre outros benefícios, concluiu.
A Constituição Federal estabelece que para se alterar critérios tributários é necessário a edição de lei complementar, que tem tramitação e requisitos próprios. A Lei 13.467/2017, ordinária, alterou tributo sem seguir esse rito, em flagrante violação à Constituição, disse Luis Antônio Almeida Cortizo, que falou em nome da Confederação Nacional dos Trabalhadores dm Comunicações e Publicidade (CONTCOP).
O advogado Robson Maia Lima, falando em nome de diversos autores da ADI 5794, reforçou o argumento de que qualquer proposição legislativa que trate de alteração em despesa ou renúncia de receita deve ser acompanhada de estimativa de impacto orçamentário e financeiro. Segundo ele, o processo legislativo que culminou na lei questionada não tem estudos de impacto financeiro e orçamentário relativos ao fim ou facultatividade da contribuição sindical, o que o tornaria nulo.
O advogado José Eymard Loguércio, falando em nome da Confederação Nacional dos Trabalhadores no Comércio e Serviços da CUT (CONTRACS/CUT), revelou que se pode até não ter simpatia pela contribuição, mas que o tema em debate é o financiamento de entidades que representam não só os trabalhadores sindicalizados, mas as categorias como um todo. Para ele, é essa condição de representantes da totalidade da categoria que exige e fundamenta a obrigatoriedade da contribuição sindical.
O representante da Confederação Nacional dos Servidores e Funcionários Públicos das Fundações, Autarquias e Prefeituras Municipais (CSPM), Jamil José Menali, frisou em sua fala que, ao deixar que o trabalhador faça opção pela contribuição, a lei cria condição diferenciada entre os iguais, uma vez que todos os trabalhadores da categoria se beneficiam dos acordos e convenções coletivos, mas só paga a contribuição o trabalhador que assim desejar, o que fere o princípio da isonomia.
Já o representante da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Movimentação de Mercadorias em Geral e Logística, Luis Antônio Camargo de Melo, revelou que 70% das entidades tendem a desaparecer com a entrada em vigor da norma questionada, o que, para ele, leva à conclusão de que o objetivo não era acabar com a contribuição sindical, mas com as próprias entidades sindicais, deixando-as sem condição de exercer suas obrigações. Para o advogado, mudanças na contribuição até poderiam ser feitas, mas não “da noite para o dia”, deixando as entidades sem sua principal fonte de custeio.
O fim da obrigatoriedade da contribuição sindical vai quebrar os sindicatos e gerar desemprego de trabalhadores que exercem atividades sindicais, salientou Marcos Antônio Alves Penido, que falou em nome da Central das Entidades de Servidores Públicos (CESP). Para o advogado, se o legislador fizesse o mesmo com outros tributos, “o Brasil deixaria de funcionar”.
O que está por trás do que se discute nesse julgamento é a ação do poder econômico, na tentativa de desmantelar a estrutura sindical do país, ressaltou o advogado Luiz Felipe Buaiz Andrade, que se manifestou em nome da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes Terrestres (CNTTT) e da Federação Nacional dos Médicos (FENAM). “Quando se retira custeio, quando se seca a fonte, se desmonta um sistema que foi erigido historicamente no país, com entidades que se organizam em prol dos trabalhadores”, salientou.
O advogado Magnus Henrique de Medeiros Farkatt falou em nome da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), da Federação Paulista dos Auxiliares de Administração Escolar (FEPAAE), da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria da Construção e do Mobiliário (Contricom), da Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB), da Central Única dos Trabalhadores (CUT), da Central da Força Sindical, da Confederação Nacional dos Trabalhadores nas Indústrias de Alimentação e Afins (CNTA), da Confederação Nacional dos Trabalhadores da Saúde (CNTS), da Nova Central Sindical dos Trabalhadores (NCST) e da Federação Interestadual dos Trabalhadores em Empresas de Rádio Televisão Aberta ou por Assinatura (Fitert).
Segundo ele, notícias veiculadas na grande imprensa apontam que houve uma redução de 88% na contribuição sindical recolhida em março de 2018, em comparação com março de 2017. Essa redução, segundo ele, trouxe efeitos drásticos para as entidades, que se viram obrigadas até a alienar parte de seu patrimônio para manterem seu funcionamento. Houve, ainda, redução no número de acordos e convenções coletivos, o que vem levando a uma redução significativa de direitos históricos dos trabalhadores, exatamente por ausência de recurso para sua organização por meio de entidades representativas, concluiu.
Representante do Sindicato dos Escreventes e Auxiliares Notarias e Registradores do Estado de São Paulo (SEANOR), Marcos Preter Silva, disse que o caráter tributário da contribuição sindical é indiscutível, e que a lei em debate criou uma espécie nova, um tributo facultativo, permitindo ao contribuinte pagar ou não. Tanto Marcos Preter quanto Maurício Garcia Palhares Zockun, que representou a Confederação Nacional dos Notários e Registradores (CNR) no julgamento, lembraram que a Constituição Federal de 1988 e a legislação impõem diversas obrigações aos sindicatos, que devem ser prestadas a toda a coletividade da categoria, não facultativamente, mas não garante subsídios para que essas entidades possam se manter e cumprir essas obrigações.
O advogado Fábio Lemos Zanão, representando a Federação dos Empregados de Agentes Autônomos do Comércio do Estado de São Paulo (FEAAC) e o Sindicato das Empresas de Serviços Contábeis e das Empresas de Assessoramento Periciais, Informações e Pesquisas no Estado de Sao Paulo (Sescon), defendeu que a questão passa pelo direito sindical e pelos direitos coletivos. Ele questionou se, no caso do fim da obrigatoriedade da contribuição, os sindicatos passarão a ser considerados meras associações, mesmo continuando obrigados a representar suas categorias como um todo, e concluiu que uma decisão nesse sentido traria contrariedade ao que dispõe o artigo 8º da Constituição, que trata da associação sindical.
Validade da lei
A advogada-geral da União, Grace Mendonça, falando em nome da Presidência da República, defendeu a improcedência das ADIs. Ela disse que as ações em julgamento partem de uma premissa equivocada, uma vez que, no seu entender, não houve fim da contribuição sindical. A eliminação não existe, mas apenas o fim da obrigatoriedade, disse. Essa contribuição social, agora, passa a ser marcada pela facultatividade. Segundo ela, a Constituição Federal assegura, em seu artigo 8º (inciso V), que não há obrigação de filiação a sindicato. O que o legislador fez, na lei em debate, foi aprimorar essa garantia, tornando o tratamento dado à contribuição sindical coerente com a liberdade de sindicalização do trabalhador.
Grace Mendonça destacou que existem outras fontes de custeio, como a contribuição confederativa, prevista na Constituição Federal. Assim, não é correto dizer que a contribuição sindical é essencial para a existência dessas entidades.
O advogado Gustavo Binembojm, que falou em nome da autora da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 55, Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV (Abert), disse que, ao contrário do que sustentam os autores das ADIs em julgamento, a Constituição Federal não define a natureza tributária da contribuição sindical. O texto constitucional, segundo ele, sequer obriga a instituição de contribuição parafiscal. O tema se enquadra à discricionariedade do legislador ordinário, uma vez que não existe necessidade de edição de lei complementar.
Vilma Toshie Kutomi, advogada que falou em nome do Instituto para Desenvolvimento do Varejo, também defendeu a facultatividade da contribuição sindical. A nova legislação, segundo ela, veio para privilegiar os verdadeiros sindicatos, que representam de forma aguerrida os trabalhadores e as empresa patronais. Dizer que os 17 mil sindicatos existentes serão extintos é uma falácia. Eles vão sobreviver porque são atores importantes no contexto social. O que vai mudar, segundo ela, é a forma de diálogo. As entidades terão que conquistar os trabalhadores e as empresas representadas.
Estão sendo julgadas, em conjunto com a ADI 5794, as ADI 5912, 5923, 5859, 5865, 5813, 5885, 5887, 5913, 5810, 5811, 5888, 5892, 5806, 5815, 5850, 5900, 5950, 5945 e a ADC 55.
MB/CR
Com informações da assessoria de imprensa do STF.