O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) garantiu o direito de uma mulher, residente do município de Vale Real (RS) e atualmente com 18 anos de idade, que sofre de toxoplasmose e de cegueira em ambos os olhos de receber o benefício assistencial de prestação continuada (BPC) do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). O pedido havia sido negado em primeira instância, mas a 6ª Turma da corte reformou a sentença, entendendo que ela faz jus ao benefício por preencher os requisitos de condição de pessoa deficiente e de situação de risco social familiar. A autora da ação também receberá as parcelas retroativas desde a data do requerimento administrativo, feito em julho de 2011. A decisão foi tomada de maneira unânime em sessão ocorrida na última semana (19/2).
A autora ingressou, em novembro de 2011, com o processo contra a autarquia requerendo a concessão do BPC. Ela narrou que possui toxoplasmose e que, em função dessa doença, perdeu quase totalmente a visão, sofrendo com cicatrizes coriorretinianas e lesões maculares nos olhos.
Alegou que pleiteou o benefício, em julho daquele ano, mas que o INSS indeferiu o pedido administrativamente com o argumento de que não fora constatada incapacidade para o trabalho e para a vida independente.
A autora afirmou que vive com a mãe e mais três irmãos em situação de miserabilidade e que não reúne condições de saúde para exercer qualquer atividade que lhe garanta o sustento próprio.
Declarou que, por conta de suas doenças incuráveis, necessita de acompanhamento constante em seu cotidiano e que possui dificuldades de aprendizagem, pois precisa de professores especializados no ensino em Braille, sendo que a escola mais próxima com esse serviço fica cerca de 40 km de distância da sua residência.
Ela requereu ao Judiciário que, além de conceder o BPC, condenasse o INSS a pagar as parcelas vencidas desde a data do requerimento administrativo. O juízo da Comarca de Feliz (RS) julgou, em fevereiro de 2019, a ação improcedente e negou os pedidos.
A mulher recorreu ao TRF4. No recurso, defendeu que estava devidamente demonstrada a sua incapacidade, pois o laudo pericial judicial concluiu que ela é portadora de cegueira em ambos os olhos. Ainda apontou que ficou comprovada a hipossuficiência do núcleo familiar, configurando o seu direito ao benefício.
A 6ª Turma do tribunal, por unanimidade, deu provimento à apelação e reformou a sentença, determinando que a autarquia implante o BPC no prazo de 45 dias. O INSS também deve pagar para a autora os valores devidos desde julho de 2011, acrescidos de juros de mora e de correção monetária.
O relator do processo, desembargador federal João Batista Pinto Silveira, ressaltou que “o direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente ou aquela pessoa que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas); e situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) do autor e de sua família”.
Sobre o caso da mulher, o magistrado registrou que “da análise do laudo médico pericial, constata-se que a autora possui visão subnormal em ambos os olhos, nitidamente agravada em seu olho esquerdo, e cicatrizes coriorretinianas. Trouxe, ainda, a parte autora, laudo ofatlmológico que atesta que ela tem importante lesão macular em ambos os olhos, maior no olho esquerdo. Esta doença ocular implica deficiência visual que enquadra a parte no conceito de pessoa portadora de deficiência, nos termos do artigo 4º do Decreto nº 3.298/99. A doença gera limitação para o desempenho de atividades próprias da faixa etária e restrição da participação social em igualdade de condições”.
Em seu voto, Silveira destacou que “a gravidade da deficiência visual da autora, os impedimentos sensoriais de longo prazo e a necessidade de acompanhamento constante de um adulto sem sombras de dúvidas caracteriza uma barreira na sua participação plena e efetiva em sociedade, porquanto a põe em condição de desigualdade em relação às demais pessoas de sua idade, motivo pelo qual deve ser reconhecida a sua incapacidade para fins de concessão do benefício”.
Ao analisar a situação econômica da requerente, o desembargador referiu que: “a respeito da hipossuficiência familiar, igualmente restou demonstrado referido requisito. Do exame do estudo social, verifica-se que o núcleo familiar é composto de cinco integrantes. A renda familiar é de um salário mínimo, proveniente do trabalho da mãe da autora, acrescido de R$ 300,00 de pensão alimentícia paga pelo pai. A família reside em casa alugada, de alvenaria, e pagam a título de aluguel R$ 300,00. Acrescentou a assistente social que a família tem despesas mensais básicas com alimentação, luz, água e gás”.
Para o relator, a conclusão é de que: “considerando o valor numérico conjugado com outros fatores indicativos da situação de risco social, e considerando que o direito ao benefício de prestação continuada não pressupõe a verificação de um estado de miserabilidade extremo – bastando estar demonstrada a insuficiência de meios para o beneficiário, dignamente, prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família-, tenho por configurada a situação de risco social necessária à concessão do benefício”.
(Foto: StockPhotos)
Com informações da assessoria de imprensa do TRF4.
Fonte